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O Labirinto de Concreto

  • Foto do escritor: Flora Simon
    Flora Simon
  • 19 de jun. de 2021
  • 5 min de leitura


O sol brilhava como nunca na selva de pedra. O vento soprava as folhas secas como que trazendo fogo diretamente do inferno. Procurando por uma sombra embaixo das escassas árvores, três amigos arrastavam os pés pela calçada. Eles miravam um edifício alto e envidraçado que se projetava no horizonte.


Após meia dúzia de passos, o trio alcança seu destino e para em frente à porta, esperando o momento do triunfo com o choque de temperatura. Sorrindo e enxugando o suor com a barra das camisas, eles suspiram e adentram o hall.


- Mas tchê, fazia tempo que essa cidade não virava o forninho. – resmunga a mais baixa deles, empurrando seus óculos para cima - O que mais podemos fazer para passar esse calor?


- Pois é, sorvete já comemos, e agora estamos no lugar mais fresquinho que tem aqui por perto. O chato é que já conheço este shopping de cabo a rabo. – falou o único rapaz do grupo, uns bons centímetros mais alto do que as amigas, e bem magricela - O que você acha, Fernanda? – pergunta ele para a outra amiga do trio.


- Olha, Adriano... Eu queria fazer algo diferente desta vez, sabe, sei lá. Deve ter um lugar novo aqui que não descobrimos ainda. Concorda, Lisa? – ela era magrela também; o rosto recheado da mais temida vilã dos pré adolescentes: espinhas.


- Falou tudo, amiga! Eu sempre quis invadir aquelas portas que dizem “só funcionários”, sabe? Fico só imaginando para onde vão. – responde ela. Os olhos brilham com a perspectiva de aventura.


- Opa, fechou todas, gurias. Eu topo! – concorda Adriano.


A excursão tem início. O trio começa a caminhar pelo shopping, com eventuais risinhos escondidos quando passavam por um guarda. Ao chegarem à entrada da porta misteriosa, olham para todos os lados. Fernanda faz o sinal de positivo e abre a porta, seguida pelos dois que a fecham nas costas com rapidez. Ao primeiro sinal de segurança, desabam a rir. Primeira barreira superada.


O corredor em que se encontravam era longo, amplo, sem qualquer tipo de decoração visível. No teto, de cada lado, havia luzes em formato circular que iluminavam de forma parcial. A parede era de azulejos brancos e o chão da mesma cor, dando um aspecto hospitalar ao local. Os três amigos começam a andar, olhando para todos os lados.


Mais alguns metros à frente, uma encruzilhada. Qual caminho poderia levar para mais aventuras? Fernanda, que estava do lado esquerdo, faz sinal com a cabeça para irem naquela direção. Os amigos acompanham, sem hesitar; Adriano olhando de relance para trás. Ao virarem neste corredor, um ar mais gelado do que o de fora arrepia todos os pelos dos seus braços.


- São aqueles ares centrais. – comenta Fernanda - Por isso quis vir por este lado, a ideia era fugir do bafo, né?


- Ah sim, mas deu até um frio aqui. – sussurra Lisa - Frio demais, achei.


- Para, Lisa, a gente acabou de sair do centro do sol e tu não quer circular nas geleiras? Vamos aproveitar esta benção. – comenta Adriano.


As duas riram, era cada analogia que o amigo inventava. No próximo corredor, decidem ir para direita, seguindo a trilha do ar. O local era idêntico ao anterior, porém com a maior parte das luzes desligadas. Ao chegarem à metade, Lisa para de andar.


- Gente, tem uma câmera ali! – Aponta para o objeto localizado abaixo de um foco de luz - Vão nos pegar!


- Mas qual o problema, presos por termos nos perdido sem querer no shopping, nunca vi disso. – responde Fernanda, fazendo um beiço e apertando os olhos.


- É, com esta cara do Gato de Botas do Shrek, fica mais fácil acreditar que não paramos aqui de propósito. – Comenta o amigo - Vamos lá, Lisa, nem achamos nada ainda!


Sem argumentos, a garota concorda com a cabeça e eles seguem em frente. O único barulho audível, além dos passos dos três, tinha origem no ar escapando pelas saídas do teto. No corredor seguinte, à esquerda, as luzes começam a piscar. Primeiro lentamente, depois aumentando a velocidade.


- Gente... – começa Lisa, fincando as unhas no amigo.


- Deve ser tempo... – inicia Adriano, mas antes de completar a frase, todas as luzes se apagam. Fernanda grita, o eco se dispersa pelos corredores infinitos. Não se escuta mais o barulho do ar, somente a respiração dos amigos.


- Na-na-na-na-não, não, não, não. – Ele senta e abraça seus joelhos, balançando o corpo para frente e para trás.


- Migo, migo. – fala Lisa, se aproximando dele e abraçando-o – Sei que você tem pavor do escuro, ma-mas vai dar tu- tudo certo, tá? – gagueja - A gente va-vai dar um jeito, né, Fer?


- Si-sim, claro. Logo volta, deve ter caído o sistema, mas todo shopping tem gerador, logo volta. – completa Fernanda, roendo as unhas.


Os três se abraçam, respirando rápido. Os minutos passam parecendo horas, a luz ainda sem voltar. O frio que antes sentiam já havia sido substituído por um calor abafado, sem origem determinada. Após mais um tempo indefinido, Fernanda quebra novamente o silencio.


- Gente, acho que vi uma luz no final daquele corredor lá. – ela pisca - Vocês conseguem ver?


- É, parece que tem mesmo. – respondeu Lisa; Adriano faz que sim com a cabeça.


De mãos dadas, o amigo entre elas, os três andam a passos lentos até o foco misterioso de luz. Cada passo parecia o fim, porém este novo corredor ainda mais extenso do que os que eles já haviam percorrido. A chegarem à frente da porta, uma fresta laranja era visível na parte de baixo, e de lá saía um calor fora do comum.


- Vocês não estão achando tudo meio esquisito, não? – sussurra Lisa.


- O que tem de esquisito? Esta luz estranha, este calor... Ah, acho que entendi. - ela começa a transpirar.


Os amigos se olham, sem conseguir se mexer. De repente não conseguiam se lembrar o que havia ao redor do shopping, muito menos o caminho até ali. Adriano arregala os olhos até sair das órbitas, Lisa se gruda na parede do corredor com os olhos fixos na fresta e Fernanda coloca as duas mãos sob a cabeça.


De súbito, a porta se abre. Uma mulher alta, vestida de forma elegante e com um crachá estampado no peito, mira o trio com um olhar fuzilador.


- Mas como que vocês vieram parar aqui em meio à tempestade?


Os três caem na gargalhada. O importante era estarem salvos, não importava mais nada. Ao espiarem para dentro viram o hall do elegante hotel - anexo ao shopping. A porta principal de entrada estava aberta, e o mesmo vento infernal soprava com força, trazendo consigo algumas folhas anunciadoras de mais um épico temporal.

 
 
 

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